tempo de escrita: 2 horas
tempo de leitura do email: 8 min
dá pra ouvir também aqui.
tá completando 5 meses que eu comecei a escrever essa newsletter autoral e, só de ter conseguido alguma consistência durante esses tempos, já tenho motivo de sobra pra celebrar \o/ tenho aprendido demais com as experiências editoriais que tenho feito por aqui e amando cada troca e descoberta. obrigada <3
um aprendizado valioso veio logo nas respostas ao primeiro e-mail. uma pessoa agradeceu pela sensibilidade de sempre. a outra pediu pra ser descadastrada pq aquele texto tava “muito ruim”.
compartilho essa história não pq valorizo mais a segunda resposta do que a primeira. mas pq muita gente que me pede ajuda com suas escritas - seja no #clubedecriadoras ou em mentorias individuais - tem o “medo do que as pessoas vão achar” como um fator de bloqueio de suas expressões. e ter recebido uma resposta tão sincera (e dura?) logo de cara me fez viver na pele o resultado de ter passado um bom tempo usando a ferramenta que eu mais indico pra quem tem esse medo do que vão achar: o olhar da apreciação.
1. com ele pude olhar pra essa resposta tentando não fazer tantos julgamentos, ou achando que precisava me defender. assim pude encontrar uma verdadeira admiração por aquela pessoa que sabia o que era bom ou não pra ela. ela estava escolhendo não receber mais os meus e-mails, que ela não gostou, e uau! saber os seus limites e desejos é algo que eu admiro demais.
2. esse olhar tbm me fez perguntar primeiro “o que será que ela quis dizer com texto ruim?” antes de assumir como verdade absoluta que o meu texto estava ruim (e querer me esconder no fundo de uma caverna junto com todos os meus escritos e ideias.)
será que ela não gostou do tema? ou foi o jeito que eu falei sobre o assunto? será que esse é um assunto difícil pra ela olhar nesse momento? será que ela encontrou erros de português? ou o tamanho do texto foi grande demais?
sem saber qual era o critério de “ruim” que ela tava usando, ficou difícil decidir se o que ela estava apontando era algo que eu queria melhorar ou não.
pra considerar algo que nos apontam, saber qual critério tá em jogo ajuda demais. e ainda sim a gnt pode escolher se o que a outra pessoa tá nos apontando faz sentido pra gente ou não.
(aqui fica uma dica para quem vai fazer um comentário sobre a criação de alguém: aponte melhorias com clareza, se você está querendo contribuir)
3. e aí vem o principal aprendizado: no fim não fazia tanta diferença o critério de bom/ruim que aquela pessoa estava usando. eu não decidi escrever pra ser bom/ruim, seja lá qual critério for.
foi por ter um olhar carinhoso e apreciativo pro meu processo, que receber uma resposta como essa não me fez pensar nem por um segundo em desistir de escrever, só pq alguém achou ruim. foi aí que eu senti firmeza no parâmetro que eu estabeleci pra seguir escrevendo essa newsletter - e talvez essa seja uma das razões pra ter conseguido alguma consistência, pensando em voz alta agora.
esse processo de escrita-publicação, tem sido, antes de mais nada, um movimento de saúde muito importante. a primeira newsletter - sim, essa que ela achou “muito ruim” - foi escrita num momento saquinho de lixo. tava há dias sem vontade de nada, sentei pra escrever meio na marra e aquele movimento me ajudou a retomar o fôlego nas semanas seguintes. então saber se aquilo pareceu bom ou ruim pra outras pessoas importou infinitamente menos do que o efeito de vida que essa escrita me causou (se tivesse ofendido/machucado/desrespeitado alguém seria outra conversa, mas não é disso que a gnt tá falando aqui).
pra falar a verdade, eu acho um milagre que tantos pensamentos que me aparecem emaranhados na cabeça consigam se organizar minimamente no papel. muitas vezes o processo de criar essa linha narrativa, que vai desembolando as ideias, leva hoooras só pra fazer o mínimo de sentido. se eu fosse me preocupar com tentar usar o melhor português ou fazer qualquer outra melhoria excessiva que fosse pra além de “passar a mensagem com o mínimo de clareza”, ia me custar tanto tempo que talvez fizesse com que eu não conseguisse escrever tanto. então amigues, quando esses textos parecerem como um rascunho, saibam que eles meio que são. conto com vocês tbm pra passarem a limpo na hora da leitura por aí ;)
sem pensar em termos de bom/ruim como um resultado final, tento me atentar pra perceber se o processo está gerando mais benefícios do que danos, pra mim e pros outros. e vejo que quanto melhor ou mais benéfico for pra mim, mais ricas são as trocas - inclusive quando elas soam como negativas - e melhor acaba sendo pros outros também.
4. e, por fim, as críticas são uma parte fundamental da construção. a gente só precisa saber manejá-las com cuidado pra preservar o que realmente importa: seguir fluindo ;)
inclusive, no livro “O Caminho do Artista” a Julia Cameron propõe uma prática pra gente investigar e lidar com as críticas de um jeito muito potente. tá lá na página 105 e eu sempre indico esse “passo a passo” pq ele tbm me já me ajudou muito.
outra leitura relacionada que eu recomendo é esse texto do Alex de Castro sobre “o que é gostar de uma obra de arte” que, segundo ele, é algo que tem muito mais a ver com o que achamos que a obra está tentando fazer, do que com alguma característica da obra em si. ou seja, parâmetro pessoal. nesse e-mail ele propõe duas perguntinhas pra gnt se fazer, pra refletir sobre o que achamos que uma obra está tentando fazer. algo que pode ajuda a gente a se tornar melhores críticos, tanto do que estamos fazendo quanto do que outras pessoas fazem.
essa reflexão que o Alex trouxe me fez pensar na nossa responsabilidade quando fazemos algum tipo de comentário sobre a criação (ou até a existência) de alguém. no acontecido que eu contei pra vcs hoje eu já estava fortalecida, de alguma forma, pra lidar com o comentário que recebi, mas podia acontecer de eu não estar né? e aí? já parou pra pensar que quando a gnt oferece um comentário mal cuidado, pode estar interferindo de um jeito muito brutal no ímpeto criativo de alguém? aliás, o Caminho do Artista é basicamente um livro pra gnt se liberar desses bloqueios que vão surgindo depois de tantos anos interagindo de uma forma descuidada com as criações.
eu acho que quanto mais a gente conseguir cuidar pra não nos bloquearmos, nem individualmente e nem uns aos outros, mais o mundo vai ser mais aberto pras expressões individuais. e isso é algo que só tende a torná-lo melhor.
vou ficando por aqui hoje.
nos vemos logo logo.
se cuidem <3
beijos
(ah! sempre bom lembrar: as vagas pro clube de criadoras, onde a gente pratica semanalmente o olhar da apreciação - e outras técnicas que impulsionam nossas criações - estão abertas pra quem quiser participar a partir de outubro. todas as informações estão nessa página. chega mais.)
saidera
a recomendação de hoje é o curta “Twenty Something”, recém lançado no Disney+, que fala de como todas as nossas experiências seguem caminhando com a gente a cada nova fase da vida. e como, por conta disso, andamos por aí com idade de adulto mas com um monte de necessidades das nossas crianças internas ainda não atendidas. é fantástica a forma que esse curta encontrou de representar essa ideia.
ele faz parte da série “SparkShorts” que são curtas criados por funcionários da Pixar se experimentando em diferentes áreas (uma ilustradora dirige um curta, por exemplo) e são escritos a partir de histórias que eles próprios propõe. é quase como se fosse um braço indie de produção de animação dentro da Pixar. eles querem abrir espaço pra desenvolver histórias mais experimentais, então são curtas até com linguagens diferentes do que a que vemos nos filmes mais comerciais do estúdio. isso faz com que as histórias abordam temáticas mais diversas e com olhares bem diferentes também. então além de incentivar a criação de novos curtas, eles de alguma forma estão valorizando as histórias das pessoas que trabalham na empresa também. um movimento muito lindo.