tempo de escrita: 3 horas
tempo de leitura: 13 minutos
(dá licença que escrevi como quem atualiza uma amiga que não falo faz tempo!)
se ficar com preguiça de ler, dá pra ouvir aqui.
Oi!
A última vez que eu escrevi por aqui o assunto era “alcançar mais flexibilidade e leveza em alguma atividade é possível com uma prática regular”.
Isso já faz mais de um ano. Desde então, não pratiquei regularmente escrever esta newsletter. E percebo, agora, o quanto isso me deixou enferrujada nesse tipo de escrita, de lá pra cá.
Relendo alguns envios antigos, fiquei surpresa com o quanto eu escrevia bonito! De onde saíam aquelas ideias? Como eu conseguia escolher as palavras com tanto cuidado? Tomei o susto de quem passou tempo longe da escrita regular o suficiente pra ousar achar que se esqueceu do caminho.
Voltar à esse tipo de escrita depois de tanto tempo me trouxe a mesma sensação de estar voltando pra academia depois de anos: o corpo está duro, e a gente acha que nunca mais vai soltar de novo. E aí vem aquela dorzinha de recomeçar. A minha sensação é de que preciso pegar no tranco, do zero, pra ter o ânimo pra recomeçar. Foi aí que me caiu uma grande ficha:
não existe mais isso de recomeçar do zero.
Com 36 anos, essa não é mais uma possibilidade pra mim. E talvez nunca tenha sido. Porque afinal de contas mesmo que a gente passe muito tempo longe de algo ou mude completamente de profissão, de identidade, de lugar, sempre começamos de algum ponto. A gente já tem alguma experiência que tá marcada no corpo. Por mais prazerosa ou difícil que tenha sido. Já temos experiências acumuladas para começar e recomeçar a partir daí infinitamente. Mesmo que nem sempre a gente consiga se lembrar disso de primeira.
Nossa bagagem de experiências é o que a gente tem de mais precioso. Seja pra honrar, seja pra ressignificar. Ou os dois. É dai que a gente recomeça.
E recomeçar é algo que vamos passar a vida inteirinha fazendo.
Melhor a gente encontrar um jeito gostoso de fazer isso acontecer.
Essa reflexão veio porque comecei uma mentoria com minha amiga Lella Sá, pra evoluir profissionalmente de uma forma que eu não estava conseguindo sozinha.
Nesse último ano, priorizei meu trabalho como gerente de comunidade da Lia Bem-Estar, um projeto que mora no meu coração e onde tenho a oportunidade de apoiar mulheres a construirem hábitos que cuidam da vida delas de uma forma integral, para viverem o seu máximo potencial. Desde maio de 2023 passamos por uma aceleração da Natura, um processo super intenso e que nos exigiu um mergulho de cabeça (percebe, o último envio foi em abril de 2023 - todo o meu tempo de trabalho, neste último ano, foi focado nessa jornada). A gente também criou jornadas junto com as mulheres que fazem parte da nossa comunidade de Aliadas, incluindo uma todinha focada na Arte de Recomeçar.
E a gente segue a pleno vapor na Lia, buscando empresas que queiram levar essa pauta pras suas colaboradoras, a gente vai começar uma série de vivências quinzenais muito lindas (vem que a inscrição pra participar pela primeira vez é gratuita!).
Mas, mesmo com todo esse trabalho lindo e potente na Lia acontecendo, sinto que agora tô conseguindo reservar um outro tempo na minha vida pra estar à serviço das pessoas para além deste trabalho. O trabalho na Lia continua mas eu quero abrir outros espaços na minha agenda.
Tenho sentido vontade também de retomar minha carreira mais autoral, trabalhando com a criatividade e a expressão em oficinas, mentorias e cursos, como vinha fazendo antes de ser mãe, no Clube de Criadoras, por exemplo.
E foi com esse foco que procurei a Lella. Logo no começo do processo com ela, bateu essa famosa angústia de me sentir estar começando do zero de novo.
Percebi que eu não enxergo a minha carreira como algo que foi sendo construído com alguma sequência "lógica". Por mais que tudo que eu tenha feito faça muito sentido pra mim, às vezes fica difícil explicar todas as coisas que eu já fiz de uma forma mais resumida, por exemplo. E isso me dá essa sensação de que eu estou sempre começando. Parece que eu estou sempre sendo iniciante em algo. Sempre tateando caminhos.
Por um lado, meu lado curioso tá sempre tendo espaço pra explorar, e isso é ótimo!
Não quero deixar esse desejo de olhar fresco de iniciante ir embora nunca da minha vida.
Mas a maturidade já tá ficando impaciente com essa exploração infinita. Tá me pedindo aprofundamento.
Isso é um baita tema na minha terapia e tenho identificado o quanto isso é também uma estratégia para eu não encarar de frente a potência do que eu posso entregar pro mundo, se eu me permitir aprofundar.
Só que o lugar da iniciante é muito gostosinho.
A gente pode silenciar a voz que diz “ai, eu não sou tão boa assim” com um “ah mas é que eu tô só começando” ao invés de encarar essa voz de frente, ter uma conversa franca com ela e fazê-la entender, de uma vez por todas, que é justamente essa autocrítica excessiva que nos impede de seguir em frente.
Ao invés de responder “eu tô só começando” pra um “eu não sou tão boa assim” eu poderia dizer “olha só o que de mais valioso você viu nessa experiência? como você pode melhorar esse aspecto do teu trabalho?” enfim, uma infinidade de conversas que podemos ter com a nossa voz autocrítica que podem ser muito saudáveis, inclusive.
Bom, a proposta da Lella envolve fazer um planejamento de curto-médio-prazo, de um jeito que inclua nossas prioridades de vida e bem-estar e não só o trabalho. É uma visão de futuro deliciosa. Mas ainda sim, visão de futuro. Não se sustenta sem planejar os passos pra chegar até lá.
Pensar em futuro me fez perceber que tô no começo sim, de uma jornada de planejar a longo prazo. Mas, com 36 anos, não posso mais me ver como iniciante. Já tenho experiência suficiente pra tanta coisa! O lugar da iniciante já não me serve mais. Só preciso me desapegar dessa visão.
Agora, tô desejando construir coisas a longo prazo como nunca antes. A arteterapia contribui pra sustentar esse olhar, porque é uma carreira em que eu me vejo ficando cada vez melhor com o tempo. Diferente da publicidade/comunicação tradicional, onde eu me via ficando desatualizada, na arteterapia eu me visualizo com um repertório, de vida e de estudo, cada vez mais vasto pra ajudar as pessoas. Essa visão também é nutrida pela convivência com as mulheres experientes na área que estou tendo a oportunidade de ter (Oi, Roze!). E assim vou colocando em cheque essa noção de que a vida “acaba” quando a gente envelhece. Pelo contrário. Sinto que vou ficar cada vez melhor. Há.
Contando com o apoio da Lella, fui convidada a revisitar minha história pra revelar meu propósito, meu jeito único de entregar valor pro mundo. Isso porque, segundo a antroposofia, dos 35 aos 42 anos é a idade de colher os frutos do que fizemos até aqui. Então, num é que faz total sentido eu estar com esse desejo de construir algo duradouro agora?
(Bom, me conta. Cê também tá se sentindo assim nessa idade? Cê já passou dessa idade? Também se sentiu assim nessa idade? Você se sente iniciante ou experiente em alguma área da sua vida? Se sentir "sempre começando” também te causa angústia? Me conta que vou adorar conversar sobre e saber que eu não to sozinha nessa!)
Pois bem, olhando pra minha história, não posso mesmo dizer que estou recomeçando do zero. Tenho 12 anos de publicidade, 10 anos de trabalho como autônoma, 4 anos de formação como arteterapeuta, 36 anos de vida, 10 anos de casamento, 8 anos morando em Floripa, 2 anos de maternidade...
Ixi, aí temos um X da questão.
A maternidade dá um tom de recomeço forte - e também desejo de construção de longo prazo - mas até mesmo essa mãe, que começou a nascer no dia 0, junto com aquele bebezinho, teve 3 décadas de experiências pra se apoiar.
Nasce uma mãe, mas não nasce uma mãe do zero.
Muito importante a gente como mulher e mãe ter certeza dessa afirmação porque essa sensação de que nasce uma mãe totalmente inexperiente pode nos causar uma insegurança maior do que de fato que a gente precisa encarar, quando a gente vira mãe.
Minha amiga Ju compartilhou esse post sobre como na verdade a gente não abandona a carreira quando vira mãe, mas sim treina outras habilidades pra aplicar nas outras áreas da vida de forma ainda mais potente.
Então é assim que me sinto agora, retomando de um outro lugar mais pontente. Parti do meu zero de maternidade carregando as experiências que eu vivi até ali, e tudo que eu vivi nesses 2 anos e 3 meses de Duda está me fazendo fortalecer muitas frentes da minha vida.
Recomeçar exige coragem e humildade de campeã olímpica
Também encontrei eco nessa questão do "recomeçar do zero" na série documental da Simone Biles, que me deu vontade de assistir depois dessa enxurrada apaixonante de ginástica que a gente teve por causa das Olimpíadas. O documentário é basicamente sobre o retorno dela e conta bastante sobre como ela lidou com as questões de saúde mental, principalmente sobre o que aconteceu depois da desistência em Tóquio. E um dos pontos que ela conta foi essa necessidade de voltar para estaca zero. Só que né, Simone Biles. Mesmo que ela tenha começado a treinar cambalhotas básicas e polichinelo, sei lá, o corpo dela já tinha registrado ali tudo que ela já tinha alcançado. E essa memória é muito profunda.
Vale a pena ver porque o tema é urgente, ela fala muito mais do que só sobre recomeçar, ela é maravilhosa, admiro muito e nossa querida Rebeca aparece um tiquin (torço para que nos próximos episódios pós-Paris ela apareça mais).
Não acho coincidência que, diante de toda essa onda de recomeços na minha vida que to abrindo o coração pra contar pra você, essa semana também peguei mais firme na academia e comecei a correr. Nessa volta à esteira, fui confirmando mais uma vez o quanto nosso corpo é guardão de memórias vivas e pulsante das nossas experiências. A gente só precisa colocar ele pra se mexer um pouquinho pra ele nos comunicar sobre a potência do que já vivemos.
Mas também percebi como os efeitos das nossas autopercepções equivocadas são tão limitantes.
Até semana passada eu diria que eu não sou uma pessoa que corre. Essa foi a história que eu contei pra mim por muito tempo. Eu diria que essa é uma das "verdades sobre quem eu sou". Dani até me perguntou esses dias: Se eu fosse convocada pras Olimpíadas, tipo TIVESSE que ir, qual esporte eu escolheria. Respondi "natação” sem nem piscar. Sou uma pessoa que nada, não uma pessoa que corre ou faz esportes coletivos, afinal de contas.
Só que, olha eu me dando conta das armadilhas que minhas crenças arranjam pra mim, há alguns anos atrás, eu treinava sim corrida regularmente! E jogava futebol! Cheguei a correr até 5 km na esteira e menos de 30 minutos, o que, pra mim, na época, pareceu um milagre. Eu saí de correr 0 para correr 5km, pela primeira vez, em bem poucos meses! Então, quer dizer, na verdade eu sei sim correr. Eu posso, também, ser uma pessoa que corre, afinal. Eu já tinha me recontado essa história. Da mesma forma que eu achava que nunca teria flexibilidade, também achava que não conseguiria correr, mas, na real, eu corri. E MESMO assim, eu segui acreditando que eu não corria.
Não é curioso como a gente não absorve nossas histórias de conquista do mesmo jeito que absorve as crenças de dificuldade?
Fico achando que é por isso que precisamos de práticas de narrativas e afirmações positivas tão frequentes. É uma necessidade nossa quase como que a necessidade por água. Não basta tomar um dia para você estar "hidratada”. É uma prática diária, constante, fundamental pra fonte criativa não secar.
E é essa relação estagnante com as crenças que nos limitam que quero apoias as pessoas a superarem, já que a arte, dentro de um processo terapêutico, é uma forma excelente de criar experiências que o corpo registra pra criar novas verdades sobre a gente mesma.
Alô Divertidamente - quem ainda não viu, vai ver! Obrigada por explicar tão bem a essência do conceito de crenças sem cair no lado místico-quântico-xarlatão que rola tanto por aí. As crenças tem uma função psíquica bem importante e que a gente precisa entender o funcionamento dela pra poder desbloquear algumas coisas na nossa vida.
Estou mexendo nesse caldeirão das minhas experiências e desejos de futuro pra ver que poção vai sair daí pra oferecer pro mundo, e planejando abrir horários pra oferecer esse apoio quem tem bloqueios com comunicação e expressão.
Se você é uma dessas pessoas, se você quer se expressar melhor ou tem dificuldades em colocar suas ideias pro mundo, me dá um alô. Se você tem notícias de alguma trava criativa que você quer superar, se você quer escrever um livro, colocar no mundo um projeto que você nunca fez, ô aqui! Estou construindo práticas arteterapêuticas focadas com essa intenção de ajudar a gente a ir pro mundo pra se expressar e eu adoraria ouvir sobre suas questões, mesmo que a gente não vá trabalhar juntas. E, se fizer sentido, também adoraria te ajudar a superar esses desafios! Me notícias?
Até breve!
Prometo que volto me breve mesmo, e não daqui 1 ano.
Um beijo,
Mari Pelli
Mari, fiquei feliz te vendo retornar à escrita. Enquanto lia, fui me reconhecendo. Como tu, tenho uma trajetória profissional explorando diferentes caminhos, cada nova aventura com sabor de descoberta e reinício, mesmo que nunca seja do zero. Bem-vinda de volta às letras, quero ler mais de ti, tuas palavras nutrem vida por aqui. 🧡